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A etapa de revisão pelos editores (desk review) na avaliação de manuscritos submetidos a periódicos científicos

Os periódicos especializados e a divulgação do conhecimento científico  

Para o desenvolvimento científico, é necessário que os resultados das pesquisas sejam divulgados de forma ampla e eficiente. Nesse contexto, os periódicos especializados têm assumido importância vital no processo de comunicação científica, uma vez que eles:
  • garantem que o conhecimento produzido seja difudido de forma rápida e eficaz;
  • proporcionam a preservação do conhecimento;
  • oferecem acesso à comunidade científica, virtualmente, de todo o mundo;
  • validam a qualidade do conhecimento difundido por meio da avaliação por pares.
Para o pesquisador, é importante publicar seus estudos em periódicos especializados, pois, dessa forma:
  • obtém reconhecimento acadêmico e social;
  • dá visibilidade ao seu trabalho;
  • garante a precedência da autoria de suas descorbertas ou elaborações teóricas;
  • pode progredir em sua carreira.

O processo de avaliação de artigos submetidos a periódicos especializado

Assim, diariamente, em todo o mundo, centenas de cientístas submetem seu artigo a periódicos especializados, na esperança de que seja publicado.
Porém, a fim de garantir a qualidade e a integridade do conhecimento difundido, os periódicos realizam uma rigorosa avaliação dos manuscritos submetidos e, nesse processo, boa parte são rejeitados. 
Essa avaliação é realizada de diferentes formas, de acordo com as políticas editoriais dos periódicos. Contudo, frequentemente, envolve duas etapas: uma realizada pela equipe editorial e outra executada por revisores externos. O objetivo deste post é discutir algumas questões relacionadas à primeira etapa.

A avaliação pelos editores


A primeira fase do processo de avaliação de um manuscrito submetido a um periódico é realizada pela equipe editorial e recebe o nome de avaliação de entrada, avaliação pelo editor ou desk review. 
Apenas os manuscritos aprovados nessa fase seguem para a avaliação por revisores externos.
É bom ressaltar que cada periódico tem um rito de avaliação específico e, frequentemente, a etapa de avaliação pelos editores passa por diversas fases, envolvendo, em um primeiro momento: pessoal de secretaria, estagiários, editores associados etc., que podem, inclusive fazer uso de softwares ou outros recursos de informática em, ao menos, parte do processo. 
Depois dessa análise inicial, o editor toma uma decisão entre: aceitar o manuscrito como ele está (casos muito raros), enviar o manuscrito para a avaliação de revisores externos ou rejeitar o manuscrito.  
Na verdade, é justamente na etapa de desk review que ocorre boa parte das rejeições dos artigos submetidos, sendo que os principais motivos de recusa são:
  • A submissão não atende às políticas editoriais do periódico;
  • Falta de relevância e/ou originalidade do estudo apresentado;
  • Falhas éticas;
  • Má qualidade do artigo.

A importância da avaliação pelos editores


A etapa de avaliaçao pelos editores é fundamental para o bom andamento dos processos de editoração de um periódico cientifico, pois:
  • Facilita o trabalho dos revisores externos, evitando que eles dispensem tempo na avaliação de artigos que não estão de acordo com a política editorial e, por isso, de qualquer forma, não seriam publicados por aquele periódico;
  • Controla o fluxo de artigos em avaliação. Se os editores enviassem todos os artigos que são submetidos para revisores externos, não haveria pesquisadores disponíveis em número suficiente para realizar essa tarefa;
  • Confere agilidade ao processo de avaliação. Se o manuscrito não atende aos padrões de qualidade ou às políticas editoriais daquele periódico, é importante que os autores tomem conhecimento o mais breve possível para que possam melhorá-lo e submetê-lo novamente;
  • Impede que circulem, mesmo no círculo restrito dos revisores externo, manuscritos que contenham graves infrações éticas;
  • Garante que apenas trabalhos de alta qualidade avancem para as próximas fases do processo editorial.

Críticas e desafios relacionados à etapa de avaliação pelos editores

O grande número de rejeições que ocorrem nessa etapa têm provocado insatisfação com esse processo. Assim, diversas críticas vem sendo formuladas, sendo as principais:
  • Muito poder concentrado na mão de uma única pessoa ou de um grupo muito pequeno de pessoas;
  • Processo altamente subjetivo, podendo sofrer influência de fatores extracientíficos, incluindo as preferências e preconceitos do editor, suas condições de trabalho, limitações de tempo etc.;
  • Quando não há padronização nos critérios, pode ocorrer inconsistências na seleção de manuscritos, potencialmente resultando na exclusão injusta de trabalhos de qualidade;
  • Má comunicação com os autores, dificultando que eles entendam plenamente as razões da recusa de seus manuscritos.

Necessidades de mudanças:

Assim, é necessário aprimorar a etapa de avaliação pelos editores na editoração de periódicos científicos. 
Uma abordagem mais transparente e objetiva, com critérios de avaliação claramente definidos, pode ajudar a mitigar a subjetividade e aumentar a equidade no processo de seleção de manuscritos. 
Nesse sentido, é necessário:
  • Melhorar a formação dos editores;
  • Definir parâmetros gerais e divulgar boas práticas de realização da revisão de entrada;
  • Incluir a revisão de entrada e o trabalho dos editores nas diretrizes éticas dos periódicos;
  • Buscar critérios de avaliação mais objetivos.
Em suma,  a avaliação pelos editores desempenha um papel crucial no processo de avaliação de artigos científicos, porém, essa etapa, assim como as demais inerentes aos processo, não está isenta de desafios. Ao reconhecer as críticas e as necessidades de mudanças, podemos trabalhar para aprimorar essa etapa, promovendo maior transparência, objetividade e qualidade na seleção de trabalhos científicos para publicação.

Referências

CRUZ, Roberto Moraes. A avaliação por pares em periódicos científico. Editorial. Revista Psicologia: Organizações & Trabalho, [s. l.], v. 22, n. 2, p. 1-4, 2022. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/rpot/v22n2/v22n2a01.pdf. Acesso em 07 maio 2024.
FALCÃO, Roberto Pessoa de Queiroz; CRUZ, Eduardo Picanço. O Processo de publicação e revisão em periódicos de alto impacto no Brasil. RASI, Volta Redonda/RJ, v. 7, n. 2, p. 102-120, 2021. Disponível em: https://rasi.vr.uff.br/index.php/rasi/article/view/483/144. Acesso em 07 maio 2024.
FROESE, Fabian Jintae; BADER Katharina. Surviving the desk‑review. Editorial. Asian Business & Management, v. 18, n. 1, p. 1-5, 2019. Disponível em: https://link.springer.com/article/10.1057/s41291-019-00060-8. Acesso em 07 maio 2024.
OLIVEIRA, Anselmo Gomes.; SILVEIRA, Dâmares. Jogo dos erros: motivos pelos quais um artigo é aceito ou rejeitado pelos periódicos científicos. Infarma: Ciências Farmacêuticas, v. 29, n. 3, p. 179-180, 2017. Disponível em http://www.revistas.cff.org.br/?journal=infarma&page=article&op=view&path%5B%5D=2211. Acesso em 07 maio 2024.

Para saber mais:

PORCELLA, Iander Moreira; JARDIM, Camila. Desk Review. Revista Arco. Publicado em 18 jan. 2017. Disponível em: https://www.ufsm.br/midias/arco/post416. Acesso em 07 maio 2024.

Leia também:

Ao submeter um artigo, fique atento às informações contidas na página do periódico: isso pode ser a diferença entre a aprovação ou a rejeição do seu manuscrito.

Você sabe o que acontece com seu artigo depois que você conclui o processo de submissão?

Imagens:
Geradas no Bing (https://www.bing.com/images/create?FORM=IRPGEN) em 07 maio 2024.

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